Os 60 anos das Emissoras Reunidas, de Arnaldo Ballvé
2006
Luiz Artur Ferraretto

Arnaldo Ballvé (1944)
Fonte: Revista do Globo, Porto Alegre: Livraria do Globo, ano 16, n. 361, p. 26, 22 abr. 1944.

Até a década de 1950, em várias cidades do interior, são comuns, na praça principal, os serviços de alto-falantes que, entre reclames do comércio, transmitem músicas e, não raro, dedicatórias a acompanhar os flertes do início de noite, em alguns dias da semana, ou os das tardes de sábado e domingo. Precedendo a instalação formal de estações, a “voz do poste”, na denominação popular, fornece, com frequência, profissionais para as novas rádios. É, em meados dos anos 1940, o caso do Serviço Alto-falante Santa Cruz Estúdio, também conhecido como Som Azul. Quando Santa Cruz do Sul coloca no ar sua primeira emissora, a maioria dos funcionários – inclusive o proprietário Elemar Gruendling – transfere-se para o novo prefixo. Situação semelhante acontece com o jornalista Luiz Napolitano, responsável pelos alto-falantes que irradiam nas proximidades da então Praça Ruy Barbosa, no centro de Caxias do Sul. Não é diferente o que ocorre com a Propaganda Sonora Guarany, de Eleodoro Antunes Fernandes, em Passo Fundo, na qual aparecem Maurício Sirotsky Sobrinho e Lamaison Porto, transformados, respectivamente, em gerente e diretor comercial da primeira rádio do município.

Nestes casos, todos envolvendo Arnaldo Ballvé, identifica-se uma estratégia comum adotada pelo empresário que, em meados dos anos 1940, começa a organizar as Emissoras Reunidas, aproveitando o pessoal dos alto-falantes ou, na ausência destes, fornecendo algum treinamento ou orientação a inexperientes candidatos a radialista. Para a administração geral deste empreendimento, o ex-diretor da Farroupilha (1935-1944) e da Gaúcha (1944) cria um staff próprio, utilizando o pessoal que havia trabalhado com ele anteriormente: Adeodato Rodrigues Araújo, Celso Fernandes, Hugo Victor Ferlauto e Paulo Amaro Salgado.

Com a denominação de Emissoras Reunidas Rádio Cultura Ltda., a empresa é registrada em 4 de dezembro de 1944. A expressão “Rádio Cultura”, utilizada na Zona Sul do estado por outro grupo, acaba sendo suprimida. Uma das nove concessões obtidas, de início, pelas Reunidas, a da ZYE-8 – Rádio Santa Cruz, de Santa Cruz do Sul, começa a sair do papel na madrugada de 11 de março de 1946, quando iniciam as transmissões experimentais. No jornal Gazeta de Santa Cruz, o empreendimento de Ballvé é saudado por sua abrangência:

É ela a primeira das estações mandadas construir pelas Emissoras Reunidas Rádio Cultura Limitada a entrar em funcionamento, sendo que a segunda será a estação de Caxias, que tem o prefixo de ZYF-3. 
Os prefixos das outras sete estações serão, para a de Alegrete, ZYE-9; Cachoeira do Sul, ZYF-4; Carazinho, ZYE-8; Cruz Alta, ZYF-9; Erechim, ZYF-7, Passo Fundo, ZYF-5; e Santo Ângelo, ZYF-6.

A inauguração da ZYE-8, semanas depois, no dia 7 de abril, confere um ar de modernidade a Santa Cruz do Sul, então com sua atividade econômica já voltada à produção de fumo. A exemplo do que ocorre no município – onde a Gazeta de Santa Cruz chega a qualificar o início das irradiações regulares como o “último laquê de civilização” ou uma “inovação há tanto tempo almejada” –, as estações do grupo, por seu pioneirismo e atuação, vão se integrar às comunidades locais, operando, em alguns casos, sem nenhuma concorrência nas três décadas seguintes.

Elemar Gruendling no estúdio da Rádio Santa Cruz (1946)
Fonte: Acervo particular da família Gruendling.

No mesmo mês de abril de 1946, no dia 27, irradiada do clube Recreio Guarany, o público da Serra gaúcha ouve pela primeira vez a identificação que, durante anos, vai abrir as transmissões da ZYF-3 – Rádio Caxias do Sul:

– Cobre agora os céus do Nordeste com sua onda alegre e amiga a ZYF-3, Rádio Caxias do Sul, que transmite na frequência de 1.460 quilociclos, onda de 205,48 metros. ZYF-3 tem seu estúdio e administração à avenida Júlio de Castilhos, 987, e suas torres e transmissor na Rua Pinheiro Machado, 815. Tudo na cidade de Caxias do Sul, Brasil.

Primeiro estúdio da Rádio Caxias, no Recreio Guarany (anos 1940)
O locutor Wilson Marchioro, tendo ao lado o gongo manual, utilizado para indicar a hora certa. Pela janela em frente, mantinha contato com o público e, pela do seu lado direito, com o operador.
Fonte: SISTEMA TRÍDIO DE COMUNICAÇÃO. Rádio Caxias 50 anos. Caxias do Sul: Editora da UCS, 1996. p. 39.


Arnaldo Ballvé discursa na inauguração da Rádio Caxias (1946)
Fonte: Acervo da Rádio Caxias.

Na Rádio Caxias, Arnaldo Ballvé começa um processo que vai se tornar comum em outras estações das Reunidas. Dá participação no negócio a empresários e ao pessoal da imprensa local, no caso Joaquim Pedro Lisboa e Luiz Napolitano. Com o tempo, esta prática envolve também gerentes das rádios. Em cada município onde instala suas estações, o diretor-gerente das Emissoras Reunidas procura, antes, informações sobre quem pode ser aproveitado no novo empreendimento. Em Passo Fundo, ouve do amigo Túlio Fontoura, liderança local do Partido Social Democrático e diretor do Diário da Manhã, elogios a um jovem locutor do serviço de alto-falantes. Contratado, em seguida, para administrar a Rádio Passo Fundo, Maurício Sirotsky Sobrinho vai estar ligado aos negócios da família Ballvé até a virada para a década de 1970. Sob a sua direção, a terceira das Reunidas entra no ar no dia 19 de agosto de 1946.

Nos anos seguintes, o grupo cresce, chegando a contar com duas dezenas de emissoras. Para auxiliar na administração de tantas rádios, Arnaldo Ballvé cria a função de inspetor-chefe, atribuída a Paulo Amaro Salgado, que, junto com outros três funcionários, faz uma espécie de auditoria em cada uma das estações. Também ocorrem reuniões periódicas com todos os gerentes das emissoras. A situação, no entanto, altera-se com a morte do empresário em 12 de junho de 1958. Um pouco antes, ele participa, como sócio majoritário, da compra da Rádio Gaúcha, que não chega a funcionar de modo coordenado com as Reunidas. Em 1962, Frederico Arnaldo Ballvé ainda vai lançar a TV Gaúcha, mas, em seguida, repassa as duas para a Rede Excelsior, de São Paulo. O crescimento da concorrência e a falta de modernização técnica e gerencial fazem com que, a partir daí, as Emissoras Reunidas comecem a se desmembrar. No início dos anos 1990, Nelson Proença assume o grupo, rebatizado, então, como Rede Comunidade, para, em junho de 2003, adotar a denominação de Rede Tchê.

Frederico Arnaldo Ballvé (1986)
O proprietário das Emissoras Reunidas discursa no aniversário de 40 anos da Rádio Passo Fundo, lembrando a importância de Arnaldo Ballvé para a comunicação do Rio Grande do Sul.
Fonte: Acervo particular de Gildo Flores e Waldir Sudbrack.

Anúncio das Emissoras Reunidas (dezembro de 1951)
Fonte: Revista do Globo, Porto Alegre, ano 23, n, 549, p. VI, 8 dez. 1951.

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