A necessidade de apostar no conteúdo
2013
Luiz Artur Ferraretto


FERRARETTO, Luiz Artur. A necessidade de apostar no conteúdo. Rádio e Negócios, São Paulo, n. 13, p. 22-23, 2013. Disponível em: <http://radioenegocios.com/edicao13.html>. Acesso em: 1 dez. 2013.

Qual a principal forma de comunicação associada aos protestos de junho de 2013 no Brasil? A resposta, óbvia para muitos, oscila entre a específica – “Facebook” – e a genérica – “redes sociais”. Opto pela mais real e, para os modernosos, menos evidente: o rádio. Ouvi de uma estudante, integrante do Bloco de Lutas pelo Transporte Público, que, para se situarem em relação à repressão policial e aos radicais dedicados à depredação pura e simples, os manifestantes estavam ouvindo as emissoras dedicadas à cobertura ao vivo dos protestos. As fotografias e os vídeos de maior teor jornalístico foram produzidas, sem dúvida, por repórteres de rádio. Com seus celulares, sem chamar atenção como um cinegrafista ou fotógrafo em função da parafernália destes profissionais, os repórteres de rádio estavam no meio dos manifestantes, contando e registrando o que acontecia. Se as redes sociais serviram para agregar militantes, o recado destes chegou, com força e em tempo real, por meio do rádio, na casa das pessoas e nos mais diversos aparatos móveis de comunicação, do agora onipresente celular aos tradicionais radinhos de pilha e autorrádios.

De fato, nesta nova realidade, não basta considerar que o rádio perdeu espaço em função de uma menor presença do aparelho receptor nas residências, como atestou a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, a última realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística: de 83,4 para 80,9%. Agora, observe que, no mesmo período, cresceu a presença de computadores com acesso à internet e de telefones celulares. E, neles, o rádio está presente e é também acessado.

No quadro das ainda chamadas novas tecnologias, você talvez faça uma série de perguntas, todas elas, com certeza, válidas: Por que sintonizar uma rádio do segmento de jornalismo em determinado horário se qualquer portal de notícias oferece, a todo momento, o mesmo tipo de conteúdo? Por que aguardar a transmissão da previsão do tempo se há aplicativos que fornecem estas informações a qualquer momento? Por que aguardar a transmissão dos boletins de trânsito se há aplicativos que fornecem estas informações a qualquer momento? Por que escutar agora uma entrevista se posso ouvi-la em streaming ou em um podcast mais tarde? Por que sintonizar uma programação musical se tenho as minhas músicas preferidas dentro do celular, em um pen drive ou em um computador? Por que ouvir a narração de um jogo de futebol pelo rádio se eu posso assisti-lo pela televisão? Respondo, apelando ao que o rádio significa para o ouvinte. Rádio não oferece apenas informação. É emoção, é sentimento, é proximidade, é a forma mais humana de se fazer comunicação de massa. Estabelece relações entre a emissora, o comunicador e o ouvinte. Fala para todos ouvintes como se falasse para cada um em particular. Porque o rádio é o único meio de comunicação de massa que permite uma recepção plena simultânea à realização de outras tarefas. Porque o rádio, desde o surgimento dos receptores transistorizados, acompanha o ouvinte. Se acompanha, torna-se, portanto, um companheiro no cotidiano. Porque o rádio, em resumo, constitui-se na primeira rede social mediada pela tecnologia eletrônica da história da humanidade.

Tecnologia faz parte deste processo? É óbvio que sim. Faz parte ao garantir o acesso do ouvinte à programação da emissora. Por exemplo, se a escuta pendeu para o FM sintonizado no celular, que as estações em AM migrem para esta faixa. E, se as redes sociais dessacralizam comunicadores, aproximando-os do ouvinte e ampliando a velha prática do “escrever-ou-ligar-para-a-emissora”, que sejam usadas em todas as suas possibilidades. Há, no entanto, que investir no conteúdo ou, em outras palavras, nos recursos humanos. Profissionais de qualidade exigem remunerações adequadas.

Bem antes da internet ou da telefonia celular, o mercado brasileiro de rádio já incorria em um erro: a aposta em utopias tecnológicas em detrimento dos recursos humanos. Do AM estereofônico – alguém lembra? – ao rádio digital, tudo mudaria, mas pouco mudou. A própria migração do analógico para o digital – uma evidente etapa técnica – não significa, isoladamente, a salvação do meio. Se é que o rádio precisa ser salvo. No futuro, com a transmissão e a recepção digital, o que você vai fazer caso não tenha um profissional qualificado a gerar conteúdo também qualificado? O que você vai fazer sem uma equipe capaz de apostar no papel do rádio como companheiro dos ouvintes, tirando vantagem da possibilidade de sua mensagem ser captada simultaneamente a outras atividades? Veja bem, atualização tecnológica é o mínimo que o seu ouvinte espera. O que ele busca, principalmente, é conteúdo. De um jeito que só o rádio pode oferecer, como um companheiro cotidiano.

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