O bordão dos cronistas esportivos
2007
Luiz Artur Ferraretto
Está lá no bom e sempre útil Dicionário Aurélio: “Palavra ou frase que se repete a cada frase na
conversa ou na escrita”. Já no rádio, bordão é um pouco mais do que isto, quase
uma marca pessoal, uma exclusividade deste ou daquele profissional, deste ou
daquele programa e, até, desta ou daquela emissora, marcando e/ou demarcando
uma personalidade para o ouvinte. E há para todos os gostos, logo neste
veículo, aquele que, nos bancos da universidade, é vítima das críticas dos
professores a respeito de clichês e de redundâncias. Clichês e redundâncias que
fazem, não raro, a delícia de ouvintes na sintonia de comunicadores muito
especiais.
Comecemos, então, pelo esporte, sempre rico quando o assunto
são frases de efeito, exageradas por vezes, mas vá lá. No Rio Grande do Sul,
quem foi guri nos anos 1960 vai lembrar da narração sóbria de Pedro Carneiro
Pereira, aquele de precisas descrições ao microfone da Rádio Guaíba. Mesmo que
não recorresse a figuras de linguagem, recurso usual nas emissoras do centro do
país, ele sempre abria as jornadas esportivas com uma frase, sua marca
registrada:
– O árbitro olha o seu relógio, nós o nosso e inicia
partida...
Da mesma escola, o grande Armindo Antônio Ranzolin não
dispensaria um “Alô, amigos” na abertura de suas intervenções como
apresentador, narrador ou comentarista. Da mesma geração e colega de ambos, o
já irreverente Lauro Quadros seria – e é até hoje – um caso à parte, criando
dezenas de bordões. Para definir profissionais ou elogiar um lance de
brilhantismo, saía com um “esse conhece o rengo sentado e o cego dormindo” ou
“ele sabe a cabeça que tem piolho”. Quando queria indicar uma área do campo de
marcação deficiente do adversário por onde um time poderia chegar ao gol,
soltava um “ali é o caminho da roça”. E, para encerrar um raciocínio, largava
sempre: “É isto aí mais meio quilo de farofa”. De segunda a sexta, conduzindo o
seu Polêmica, na Gaúcha, ainda brinca
com as palavras, incentivando os ouvintes a ligarem para o programa:
– Não se esconda, responda! – em meio a outras frases que vão
surgindo conforme o andamento dos debates.
Agora, os reis dos bordões são mesmo os narradores de teor
mais conotativo, como os estudiosos definem os que abusam das metáforas,
metonímias e outros que tais. Neste estilo, quem mais fez sucesso no Rio Grande
do Sul nas últimas três décadas foi um paranaense aqui chegado de Minas Gerais:
Haroldo de Souza, hoje na Rádio Guaíba. O radialista vai escandindo vogais na
sua maneira particular de anunciar o gol – “Adiviiiiiinheeee...” – para, logo
em seguida, incentivar a comemoração do momento máximo do futebol – “As
bandeiras estão tremuuulaaando, tremuuulaaando... torcedor do Brasil” –, fala
secundada, em meados da década de 1970, por uma vinheta repetindo-a na forma de
música. Quando o time local está em desvantagem, Haroldo transporta-se para as
arquibancadas: “E, agora, tchê?” ou “Isto é profundamente lamentável, torcedor
do Brasil”. Esta última é usada, ainda, quando alguém comete uma falta grave.
Se o jogador erra em gol ou, para evitar o ataque do adversário, chuta para
fora do campo de jogo, vem um “É bola pro mato que é jogo de campeonato”. Ironia
do destino, ao se transferir para a Gaúcha, na sua primeira escala no estado,
Haroldo de Souza chega justamente para contrapor com o seu estilo a sobriedade
da concorrente, a Guaíba, sua emissora nos anos 1990 e 2000.
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