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A Rádio Pampa aposta em jornalismo
2014
Luiz Artur Ferraretto


No segundo semestre de 1984, a crescente crise da Guaíba AM deixa espaços a serem preenchidos no segmento de jornalismo, oportunidade a ser aproveitada pela Rede Rio-grandense de Emissoras, que, buscando este nicho de mercado, estrutura uma nova Rádio Pampa nos 970 kHz, usando, também, as ondas curtas de 25, 31 e 49 metros anteriormente ocupadas pela Cultura OC. A estação de Gadret procura carrear para si os ouvintes descontentes com a decadência da Guaíba, a serem atraídos por uma linha de programação muito semelhante, sem se dedicar à cobertura esportiva, mas caracterizada pela presença majoritária de ex-funcionários da rádio ligada à Caldas Júnior. Assim, transferem-se para o quarto e o quinto andares da rua dos Andradas, 756, sede do novo empreendimento: José Augusto Barth de Oliveira, supervisor do projeto de implantação da Pampa e responsável pela área comercial das rádios da Rede Rio-grandense de Emissoras; Adroaldo Streck, diretor-geral da emissora e apresentador; Luiz Figueredo, editor-chefe de Jornalismo; José Barrionuevo, Lauro Quadros, Rogério Mendelski, Tânia Carvalho e Walter Galvani, que se revezam ao microfone; e Lauro Hagemann, titular do Correspondente Alfred, tentativa de fazer frente ao tradicional noticiário da Guaíba. Acompanhando o início das transmissões em 3 de dezembro, o slogan “Venha para o meio do rádio” aparece em anúncios veiculados no canal 4, então afiliado à Rede Manchete, de Adolfo Bloch, e no Jornal do Comércio, onde vários dos novos funcionários da Pampa possuem colunas assinadas. Dias antes, em uma delas, Adroaldo Streck faz questão de relacionar a nova empreitada com a ideia que norteou a instalação por Arlindo Pasqualini da própria Guaíba, quase três décadas antes:

Sem força suficiente para impedir que se destrua uma grande equipe de rádio, não me restou outro caminho que aceitar convite para formar um novo grupo, numa nova emissora de rádio, que procurará manter vivos os ensinamentos e o ideal de Arlindo Pasqualini, através do trabalho conjunto de alguns discípulos seus.
Sinto, neste momento, saudade do Major. Ele, sereno e justo, certamente, nos ajudaria nesta nova empreitada. Mas, antes, talvez, chorássemos juntos pelo que está sendo destruído de forma tão irresponsável e despótica.

Na inauguração desta nova fase da Pampa, lideranças políticas e empresariais vão se revezar ao microfone ao longo do dia, forma também de dar credibilidade ao empreendimento.


Lideranças políticas na inauguração da nova programação da Rádio Pampa AM (3 de dezembro de 1984)
Da esquerda para direita, Lauro Quadros; Dilamar Machado, deputado estadual do PDT; Adroaldo Streck; Renan Kurtz, deputado estadual do PDT; Otávio Dumit Gadret; e Roberto Cardona, deputado estadual do PDS.
Fonte: Jornal do Comércio, Porto Alegre, 4 dez. 1984. p. 17.


Otávio Dumit Gadret e lideranças empresariais na inauguração da nova programação da Rádio Pampa AM (3 de dezembro de 1984)
Fonte: Jornal do Comércio, Porto Alegre, 4 dez. 1984. p. 17.


Nos dois anos seguintes, a Pampa mantém-se como uma alternativa em um segmento crescentemente dominado pela Gaúcha. Enfrenta, ainda, a força da marca Guaíba, revitalizada pelos investimentos realizados, em meados de 1986, por Renato Ribeiro, novo proprietário da rádio, da TV2 Guaíba e da Caldas Júnior. Neste contexto, perde alguns dos seus profissionais, como Lauro Quadros (agosto de 1985) e Rogério Mendelski (fevereiro de 1987), para os veículos da Rede Brasil Sul, e Luiz Figueredo (final de 1986), que fortalece, primeiro, a equipe da Guaíba e, em seguida, a do Correio do Povo. Atuando no mercado de jornalismo, mas fugindo à sobriedade da Pampa e da Guaíba, há, ainda, as experiências episódicas das rádios Sucesso, Difusora-Bandeirantes e Gazeta. Por esta época, apostando na reduzida inflação dos meses posteriores ao Plano Cruzado, Otávio Gadret contrai empréstimos e investe na montagem de estações de televisão no interior do Rio Grande do Sul. Lança, também, o Jornal Meridional, que estreia na TV Pampa no dia 12 de maio de 1986.

No segundo semestre, começam os problemas com a retração do mercado publicitário após o crescimento no consumo. A inflação eleva-se mês a mês, após as eleições de novembro, quando a estabilização econômica – mantida artificialmente até aquele momento – dá a vitória aos partidos da base de sustentação do governo federal. Para se ter uma ideia, conforme o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI), passa de 65,04, em 1986, para 415,95% no ano seguinte. Estes fatores associados levam ao fim do projeto de jornalismo dentro da Rede Pampa de Comunicação, nova denominação genérica que o grupo passa a utilizar em meio à euforia do Cruzado. Assim, no primeiro semestre de 1987, as entrevistas, as notícias e as reportagens da Pampa, decalcadas do Estilo Guaíba, dão lugar à improvisação, como registra a Revista Sul, em junho de 1987:

Os ouvintes não entenderam nada. Na manhã de quarta-feira, 14 de maio, a Rádio Pampa transmitia música e Paulo Josué, locutor emprestado pela Caiçara, lia a Zero Hora. Nem Adroaldo Streck, nem Tânia Carvalho, nem Joabel Pereira e Walter Galvani.

Logo em seguida, no dia 30 de junho de 1987, sai do ar o Jornal Meridional. A Rádio Pampa adota, desta época até o final dos anos 1990, uma programação de estúdio, baseada em entrevistas e na participação do ouvinte a marcar o slogan “A tribuna livre do Rio Grande”. Desta época até o final da década seguinte, entre os comunicadores, destacam-se Beatriz Fagundes, Enir Borges, Gilberto Gianuca e Sérgio Jockymann.
Duas historinhas em meio ao motim no Presídio Central de Porto Alegre
2007
Luiz Artur Ferraretto

Zero Hora noticia o motim do Presídio Central (29 de julho de 1987)
Fonte: Zero Hora, Porto Alegre, 29 jul. 1987. p. 1.


Em julho de 1987, a capital gaúcha se deu conta, pela primeira vez, do agravamento das condições gerais de segurança, que iriam, aos poucos, mergulhar a sociedade brasileira no caos dos dias de hoje, com os traficantes representando uma espécie de poder paralelo, em especial nas comunidades marginalizadas das favelas. Com o sistema penitenciário do Rio Grande do Sul vivendo “o dia mais agitado de sua história”, na definição do jornal Zero Hora, as rádios vão narrar minuto a minuto o primeiro grande motim do Presídio Central de Porto Alegre.

A cobertura atesta, no entanto, o poder de mobilização da Rádio Gaúcha. A emissora, na realidade, noticia a rebelião iniciada às 10h20 com cerca de uma hora de atraso em relação à sua principal concorrente – a Guaíba –, deslocando um repórter – o jornalista Vitor Bley de Moraes – apenas no final da manhã. No entanto, a partir daí, rapidamente, outros profissionais dirigem-se para pontos-chave como o Hospital de Pronto Socorro e a Secretaria Estadual da Segurança Pública. Juntam-se à equipe, nas proximidades do presídio e em outros locais importantes, os apresentadores José Antônio Daudt e Rogério Mendelski, além de integrantes do Departamento de Esportes como Pedro Ernesto Denardin. Durante as oito horas e meia de motim e, após, acompanhando a perseguição e captura dos foragidos, vai se destacar, ainda, a repórter Tânia Regina da Silva.

O trabalho realizado pela Gaúcha, sempre sob a supervisão de Marco Antônio Baggio e a coordenação de Cláudio Moretto do Nascimento, vai ser reconhecido pela Associação Rio-grandense de Imprensa em sua premiação anual. Na edição de 1987, Tânia Regina da Silva e equipe conquistam o prêmio de radiojornalismo com a cobertura do motim no Presídio Central, tragédia do cotidiano que encobriria pelo menos dois fatos curiosos. Ambos só ocorridos devido a uma eventualidade: os amotinados concentram-se ao lado de uma janela muito próxima da cerca que dá para a rua, onde estão os repórteres de vários veículos de comunicação.

Logo no início da confusão, o jornalista Vitor Bley de Moraes estende o braço direito e, com o gravador em punho na direção da tal janela, onde está um dos líderes do motim, o então líder no tráfico no Morro da Cruz, pede:

– Carioca, dá um relato para os ouvintes da Gaúcha sobre como está a situação aí dentro...

– Tu queres saber como está aqui... – diz Carioca, voltando-se para um dos outros amotinados, por coincidência um dos mais perigosos do estado – Mostra pra ele como tá aqui, Vico...

O preso aproxima-se da janela e grita:

– Aqui, tá assim... – e vai apontando uma cano cerrado para os jornalistas, que, amedrontados, jogam-se no chão, em meio a um barral sem tamanho, tentando fugir de balas que não chegam, por sorte, a ser disparadas.

Horas depois, com a Gaúcha já com toda a sua equipe mobilizada, o jornalista José Antônio Daudt passa a comandar a cobertura no mesmo local. Em uma época sem as facilidades do celular, longos cabos são estendidos das unidades móveis, permitindo a transmissão ao vivo. Com 31 funcionários do Instituto de Biotipologia Criminal em poder dos presos, Daudt, usando o fato de ser deputado estadual pelo PMDB, chega a se oferecer em uma troca para garantir a segurança dos reféns. A resposta, algo depreciativa, algo agressiva, dos amotinados é captada pelo microfone da Gaúcha:

– Tu não tá com essa bola toda!

No final, morrem duas pessoas e os oito presos conseguem fugir do Presídio Central em dois automóveis cedidos pelas autoridades.

Cobertura realizada pela Rádio Gaúcha (28 de julho de 1987)
O repórter Vitor Bley de Moraes resume a situação no Presídio Central de Porto Alegre.

José Antônio Daudt entrevista Luiz Ronaldo Silva, o Prego, um dos amotinados.

A repórter Tânia Regina descreve quem são os amotinados.

José Antônio Daudt e Rogério Mendelski descrevem um momento de tensão com ameaças dos presos aos jornalistas.

A equipe da Rádio Gaúcha descreve a fuga dos presos.
Fonte: RÁDIO GAÚCHA. Cobertura do motim no Presídio Central. Porto Alegre, 1987. Programa de rádio.
Rogério Mendelski e o Gaúcha Hoje
2015
Luiz Artur Ferraretto
Rogério Mendelski (2002)
Fonte: Press, Porto Alegre, n. 22, p. 6 , 2002.

Ao longo dos quatro anos em que Olívio Dutra governou o Rio Grande do Sul, Rogério Mendelski tinha dois tipos de ouvintes: quem sintonizava a Rádio Gaúcha por concordar com suas incansáveis críticas à esquerda e ao Partido dos Trabalhadores e quem ligava na emissora para se irritar com estas mesmas críticas. Como consequência de sua habilidade verbal, o Gaúcha Hoje liderava, deste modo, a audiência no início da manhã, pelo menos até 7h, quando Sergio Zambiasi passava a ocupar o microfone da Farroupilha, e Mendelski caía para o segundo lugar.
Questões ideológicas à parte, o Gaúcha Hoje, de fevereiro de 1987 até novembro de 2002, constitui-se no mais bem acabado exemplo de programa essencialmente calcado na opinião de seu apresentador. Ao microfone, Rogério critica os sem-terra, as greves do magistério estadual, os defensores das estatais, enfim, faz a pregação do liberalismo econômico em linguagem direta e, sem alterar o tom de voz, bastante agressiva.Até novembro de 2002, ganhando mais meia hora na parte final em 1988, as posições defendidas pelo apresentador dão a tônica acima de quaisquer outros tipos de conteúdos veiculados, qualificando o Gaúcha Hoje como um programa de opinião, aquele no qual o lado opinativo do apresentador predomina, tornando-se este a atração principal, secundada por comentaristas e mesmo repórteres.
Na virada do século, quando se acirram os ânimos políticos no estado entre dois polos bem delimitados, um representado pelo governo de Antonio Britto Filho (1995-1998), do PMDB, identificado com as posturas do neoliberalismo, e outro pelo de Olívio Dutra (1999-2002), do PT, colocando-se à esquerda e se propugnando como socialista, as opiniões de Mendelski, não raro, geram reações diversas junto ao público, ao ponto de ser chamado pela imprensa de “a voz polêmica do rádio”. Ao microfone, poucas vezes alterando o tom de voz, normalmente calmo, o apresentador defende, basicamente, a economia de mercado, a livre iniciativa e a propriedade privada, pilares do sistema capitalista, posições que, cabe lembrar, vão ao encontro, na época, daquilo que a Rede Brasil Sul considera como seu ideário e expressa no documento Normas Editoriais, divulgado então. Assim, a partir deste enfoque, movimentos grevistas, ocupações de áreas rurais por colonos sem-terra, eventos antiglobalização e medidas liberalizantes na área de segurança pública tornam-se alvo constante de fortes críticas do jornalista, a maioria delas eivada de consideráveis doses de ironia e sarcasmo. No final de 2002, um pouco antes de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, à frente de uma frente partidária de centro-esquerda, assumir a Presidência da República, Mendelski é dispensado pela RBS. Edgar Lisboa e Demétrio de Azevedo Soster registram, assim, a saída do comunicador em reportagem publicada no semanário ABC Domingo:
Metade do estado gostava de ouvir a voz de Rogério Mendelski, ex-RBS, nas primeiras horas da manhã em seu programa Gaúcha Hoje. A outra metade o odiava. Ódios e amores à parte, o fato é que, todos os dias, cerca de 50 mil pessoas por minuto (o programa durava duas horas) deixaram de escutar diariamente uma das vozes mais polêmicas do radiojornalismo gaúcho (...): sob a alegação de que os novos tempos exigiam formatos mais leves, Mendelski foi demitido depois de 15,9 anos de empresa. Antes disso, foi suspenso sob acusação de ter faltado com o respeito para com um dos anunciantes de sua ex-empresa. 
Como registrara dias antes, em 26 de novembro de 2002, o portal Coletiva, o anunciante, no caso, era a TIM. Ao comentar uma reclamação a respeito da empresa, Rogério Mendelski aconselhou o ouvinte a optar pela Telefônica Celular, uma das patrocinadoras do Gaúcha Hoje. A TIM, anunciante em outros espaços da programação, protestou, acarretando a suspensão e, em seguida, a demissão do apresentador.
A contundência de Rogério, no entanto, ficava mesmo para o microfone. No dia a dia, Mendelski demonstrava extrema cordialidade, sendo considerado um excelente colega de trabalho mesmo por seus companheiros de outros campos ideológicos. A respeito, aliás, registrava o site da revista Press, na época:
 Na TV COM e na RBS TV o clima hoje foi de tristeza. Justifica-se: Rogério, apesar de passar uma imagem de "duro" no ar, no dia a dia está sempre brincando – os colegas, para ele, são grandes amigos.As próprias estrelas da RBS consideram que foi um equívoco a "aposentadoria antecipada" do comunicador. E, além disso, está dando bala para a concorrência.
A saída de Mendelski levaria Antônio Carlos Macedo para o comando do Gaúcha Hoje, com o programa adquirindo uma feição cada vez mais informativa e menos opinativa, além de apostar na intensa participação do ouvinte.


Rogério Mendelski defende a privatização da telefonia celular
Fonte: RÁDIO GAÚCHA. Gaúcha Hoje, Porto Alegre, 200-. Programa de rádio.